O brincar é sempre libertador, construtivo e uma ponte para a autonomia e independência, através do brincar a criança experimenta diversos papéis e vai, de personagem em personagem, descobrindo-se e descobrindo o mundo, o brincar tem assim qualquer coisa de mágico, que ensina uma criança a ser ela própria, a relacionar-se e a crescer. Neste contexto, podemos e devemos olhar para o brincar como um grande impulsionador do desenvolvimento das crianças e olhar para brinquedos como uma ferramenta facilitadora desse desenvolvimento.
Por isso mesmo, os brinquedos - por si só - não devem ter um género associado, uma vez que, quer uma menina quer um menino precisam de experimentar diferentes papéis, desde a caixa de ferramentas, à cozinha ou à sala de médicos, por exemplo.
Sempre houve uma associação de género aos brinquedos, os tradicionais brinquedos de meninas e de meninos. Esta associação acontece por uma questão social, cultural e pelas expectativas associadas àquilo que é esperado dos meninos e das meninas e das aprendizagens que esperamos que façam. No entanto, e para o bem da evolução da sociedade, começamos - agora - a colocar questões e a abrir espaço a que as aprendizagens feitas na infância - pelo brincar e não só - sejam cada vez mais amplas e plurais. Estamos a diminuir, ainda que gradualmente, os géneros associados aos brinquedos e a abrir espaço a que cada criança possa experimentar os papéis que quiser, independentemente do seu género.
Quando separamos os brinquedos de menina dos brinquedos de menino de uma forma rígida, estamos automaticamente a associar diferentes papéis aos meninos e às meninas e estamos a depositar diferentes expectativas para o futuro de cada um deles. Quando um menino é impedido de brincar com barbies estamos a transmitir-lhe de forma subliminar a mensagem de que brincar com barbies não é para meninos e que, se ele o deseja fazer é porque está errado. No entanto, enquanto um menino brinca com barbies está a explorar, está a conhecer e está a crescer e, tal não significa - em momento algum - que seja menos menino por isso.
O brincar é sempre o primeiro nível da aprendizagem e a primeira forma de lidarmos com tudo aquilo que pensamos, sentimos e experienciamos. A verdade é que uma criança procura os brinquedos que melhor se alinham com o seu mundo interno em determinado momento e que lhe permite elaborar a sua realidade, as suas emoções, os seus anseios, as suas expectativas e os seus desejos, assim, pela fantasia - que é o brincar - elabora o seu dia a dia e, como não podia deixar de ser, aprende e desenvolve-se.
Apesar desta função, cada criança é única e, por isso mesmo, cada criança tem as suas realidades, as suas necessidades e os seus interesses em específico, por isso, não é porque uma criança não brinque com carrinhos que não poderá no futuro ser uma boa condutora, ou porque não brinque às cozinhas que não será uma boa cozinheira. Devemos deixar a criança explorar o mundo no sentido que o seu mundo interno lhe pede, sem a condicionarmos, criarmos barreiras ou ficarmos demasiado assustados porque está a fugir de tudo aquilo que consideramos - à partida - o esperado.
As preferências das crianças relativamente a brinquedos estão sempre ligadas ao seu mundo interno e à sua realidade. Por isso, sim, no limite é possível influenciarmos os interesses de uma criança e as suas escolhas e, naturalmente, o seu contexto acaba sempre por o fazer de alguma forma. Ainda assim, é sempre mais saudável quando uma criança consegue manter os seus interesses e as suas escolhas de forma mais espontânea e mais livre de tudo aquilo que a pode condicionar.
Quando uma criança se permite a ser livre e é capaz de escolher um brinquedo que sabe - à partida - que os pais ou a sociedade, vão rejeitar, está a ser corajosa e autêntica. E quando somos capazes de ser autênticos e verdadeiros connosco próprios somos sempre mais felizes e mais capazes. Desta forma, se uma menina pede uma mala de ferramentas ou um menino pede um nenuco, devemos permitir-lhe que viva essa experiência, que explore essa personagem, sem receio e sem estereótipos, nunca nos esquecendo que brincar é dos movimentos mais saudáveis e promotores do desenvolvimento que uma criança pode ter.
A resistência da parte dos adultos em aceitar as escolhas das crianças existe, principalmente, pelos estereótipos que habitualmente nos são incutidos pela sociedade. Assim, tendemos a ter receio que um menino com uma barbie na escola seja gozado, por exemplo, e tendemos a condicionar a escolha da criança, muitas vezes, com o simples intuito de a proteger. Fazemo-lo porque ainda nos encontramos, enquanto sociedade, demasiado condicionados aos papéis de homem e de mulher, neste sentido, acabamos por nos inibir de alguns comportamentos devido a esses papéis e tentamos levar as crianças nessa inibição de igual forma. Apesar de tudo isso, estamos neste momento, mais perto de diminuir os estereótipos e permitir a liberdade a cada menino e a cada menina.
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